10.5.10

Justa homenagem

Gotan Project, Cortázar, 'Rayuela', Capítulo 7. Dispensa apresentações:

3.5.10

Tudo pode dar certo

Se você é um daqueles fãs fervorosos do Woody Allen, cuidado! ‘Tudo pode dar certo’ provoca reações adversas e extremamente indesejáveis – como gargalhadas escandalosas, agitação incontida e... palmas!

O filme, cujo título original, ‘Whatever Works’, é infinitamente mais significativo, remete à primeira fase da carreira do diretor, com suas comédias nova-iorquinas e protagonistas pessimistas e divertidíssimos. Dessa vez, no papel que seria de Woody Allen, está Larry David, o co-autor de Seinfeld, impecável.

Na pele do ‘gênio’ Boris, ele passa o filme a amaldiçoar a humanidade, a sociedade, a religião e a estupidez de todas as pessoas que não possuem a sua ‘visão geral’ – somente ele enxerga que está dentro de um filme e conversa com a platéia, por exemplo, deixando os demais atônitos e se passando por esquizofrênico. Boris é hipocondríaco e depressivo, além de ser um suicida incompetente. Porém, isso não impede que Melody (Evan Rachel Wood) se apaixone por ele.

A garota de 21 anos cai como que de paraquedas na vida de Boris, que até então se dedicava a manter o isolamento quase absoluto. Após fugir da casa dos pais – xiitas religiosos – por ter perdido a virgindade atrás de uma barraquinha de peixe frito, Melody vai parar em Nova York e acaba ficando na casa de Boris ‘até conseguir juntar dinheiro e ter sua própria casa’. O conflito, no entanto está no fato de que a menina é burra feito uma porta, se não foi pior do que isso.

Com o tempo, Boris começa a enxergar além da burrice de Melody. Ele se apaixona por sua submissão e pela admiração devotada a ele. Além disso, a absorção e repetição das filosofias mal humoradas de Boris feita pela menina rendem algumas das melhores sacadas do filme e, claro, encantam o protagonista egocêntrico. É muito interessante observar como Rachel Wood vai se apresentando cada vez mais bonita e cativante à medida em que Boris se apaixona por ela.

‘Tudo pode dar certo’ é um filme sobre quebra de paradigmas. Cheio de personagens quase caricatos, retrata aquilo que muitas vezes temos uma dificuldade absurda de enxergar e traz à tona alguns pontos de interrogação: quem criou as regras? quem disse que segui-las é o melhor a se fazer?

Em meio a tanto pessimismo, esse filme poderia ser pesado e indigesto por abordar de forma certeira o individualismo e o isolamento aos quais às vezes nos submetemos. Mas a mão de Woody Allen jamais permitiria algo desse tipo e a grosseria constrangedora de Boris ou a cegueira religiosa da família de Melody acabam se tornando passagens hilárias. Pelo que observei no cinema, é difícil alguém resistir ao humor ácido do diretor. No entanto, repito: cuidado se você for um seguidor de Woody Allen. Contenha-se! Quem está sentado na poltrona da frente não tem nada a ver com isso.